Penetrar o mundo de Clarice Lispector é arriscar perder-se em si mesmo. Deixar-se envolver é inevitável. Um mar de gavetas nos espera: o que iremos encontrar no fundo?
O que sustenta as paredes de minha casa é a certeza de que eu sempre me justificarei,
meus amigos não me justificarão, mas meus inimigos, que são meus cúmplices,
esses me cumprimentarão.
E continuo a morar na casa fraca.
Para que minha casa funcione, exijo de mim como primeiro dever que eu seja sonsa,
que eu não exerça a minha revolta e o meu amor, guardados.
Se eu não for sonsa, minha casa estremece.
Clarice, 1962.
Como o som de uma pulsação. A luz rítmica entrecruza caminhos e
frases, mensagens e lugares, que refletem-se
frases, mensagens e lugares, que refletem-se
translucidamente em e sobre mim. É a vertigem do tempo-espaço,
sujeito-significado.
sujeito-significado.
Quarto íntimo. Penetro o seu mundo e suas palavras. Vou além do
significado - sinto. O colchão, ao centro,
significado - sinto. O colchão, ao centro,
expõe suas entranhas - pulmão e coração. Ou seriam só molas?
Mas eu denuncio.
Denuncio nossa fraqueza e o horror alucinante de morrer
- e respondo a toda essa infâmia com exatamente isto que vai agora ficar escrito
- respondo a toda essa infâmia com a alegria.
Puríssima e levíssima alegria.
*A única salvação de um ser humano é a alegria.
Vida é o desejo de continuar vivendo, e viva é aquela coisa que vai morrer.
A vida serve pra se morrer dela.
Criar não é imaginação, é correr o grande risco de se ter a realidade.
O mundo independia de mim e não estou entendendo o que disser.
Porque como usar a palavra sem que a palavra minta por mim?
A vida se-me é. A vida se-me é, e não entendo. Por isso adoro.